A nossa língua é rica em expressões populares curiosas, com origens por vezes peculiares. Muitas destas expressões são ainda de uso comum, mas nem sempre sabemos de onde se originou a frase. De uma forma ou de outra, todas elas contribuem para enriquecer a língua portuguesa.
Estas expressões portuguesas acabam por fazer parte do nosso dia-a-dia e são utilizadas nas mais variadas situações. Representam uma espécie de sabedoria popular ou algo que é aceite por todos como uma verdade absoluta. Algumas são engraçadas e outras são mais sérias. O certo é que todas elas são muito antigas.
Descobrir a sua origem significar aprender também um pouco mais sobre nós próprios e sobre a nossa história. Assim, deixamos-lhe aqui 24 expressões portuguesas, a sua origem e o seu significado:
1. Andar com o rei na barriga
Esta expressão vem dos tempos da monarquia, altura em que as rainhas eram tratadas com especial deferência quando estavam grávidas, já que iam aumentar a prole real e dar herdeiros ao trono. Hoje, a expressão refere-se a alguém que dá muita importância a si mesma.
2. Com a corda toda
Os brinquedos de antigamente eram acionados ao torcer-se um mecanismo em forma de mola ou de elástico, sendo chamados brinquedos “de corda”. Quando se dava mais “corda” a um brinquedo, ele mexia-se mais depressa e de forma frenética, sendo que a expressão ainda hoje denomina alguém que se encontra nesse estado.
3. Bicho de sete cabeças
Esta expressão tem origem na lenda da Hidra de Lerna, um monstro que tinha sete cabeças que, ao serem cortadas, renasciam. Uma das doze proezas de Hércules foi matar esse animal. No entanto, a expressão hoje denomina a atitude de alguém que, quando confrontado por uma dificuldade, coloca entraves à realização da tarefa, seja por medo seja por preguiça de a enfrentar.
4. Tapar o sol com a peneira
Uma peneira é um objeto circular com fundo em rede de metal, por onde se costuma passar a farinha ou qualquer outra substância moída. Como o fundo é em rede, qualquer tentativa de tapar o sol com uma peneira é infrutífera. Assim, a expressão nasceu desta constatação, designando um esforço mal-sucedido para ocultar uma asneira ou negar uma evidência.
5. Farinha do mesmo saco
A origem desta expressão é uma frase em latim usada para generalizar um comportamento tido como reprovável: “Homines sunt ejusdem farinae” (literalmente “homens da mesma farinha”. Como a farinha boa era colocada no mesmo saco que a farinha boa, e a farinha má num saco com mais farinha de menor qualidade, faz-se esta comparação para insinuar que pessoas boas andam com pessoas boas, enquanto pessoas más preferem a companhia de pessoas más.
6. Sangria desatada
A expressão teve origem nas guerras, onde havia necessidade de um cuidado rápido dos feridos. Se, por qualquer motivo, a ligadura colocada sobre as feridas se desatasse, haveria grande perda de sangue e o soldado morreria. Nos campos de batalha, seria comum, assim, esta “sangria desatada”. Hoje, a expressão é usada para nos referirmos a qualquer coisa que precisa de solução ou realização imediata.
7. Colocar panos quentes
Colocar panos quentes na testa de alguém é um cuidado paliativo de origem remota em estados febris, já que os panos encharcados em água quente elevam a sudorese e fazem baixar a febre. A expressão significa hoje favorecer ou encobrir algo de errado feito por outra pessoa.
8. Salvo pelo gongo
Expressão com origem na Inglaterra, local onde não havia espaço para enterrar todos os mortos e onde, por isso, se reutilizavam os caixões, retirando-se as ossadas do anterior proprietário e usando o túmulo para outra pessoa.
Ao abrirem os caixões, podiam-se encontrar por vezes marcas de unhas e arranhões no interior, o que mostrava que aquela pessoa tinha sido enterrada viva, algo comum na altura.
Assim, começou-se a deixar uma tira no pulso do defunto, que passava por um buraco no caixão e que ficava amarrada a um sino. Se o indivíduo acordasse, o sino tocaria, podendo assim ser resgatado. Atualmente, esta expressão significa escapar de uma encrenca numa fração de segundos.
9. Comer com os olhos
Na Roma Antiga, existia o costume de, numa cerimónia religiosa fúnebre, oferecer um banquete aos deuses, sendo que ninguém podia tocar na comida. Apenas olhavam, surgindo daí a expressão “comer com os olhos”. Nos nossos dias, significa apreciar de longe algo, sem lhe tocar.
10. Gatos pingados
A expressão tem origem numa tortura originária do Japão, que consistia em pingar óleo a ferver por cima de pessoas ou animais, em especial gatos. Como estes suplícios costumavam ter uma assistência reduzida, tal a crueldade demonstrada, a expressão passou a significar uma pequena assistência sem entusiasmo para qualquer evento.
11. Sem papas na língua
As papas (ou pepitas) são partículas que surgem na língua de algumas galinhas, sendo uma espécie de tumor que as impede de cacarejar. Sem as papas, a língua fica livre. A expressão vem da frase castelhana “no tener pepitas en la lengua”, e significa hoje ser franco e dizer o que quer sem rodeios.
12. Maria vai com as outras
A rainha D. Maria I ficou louca de um dia para o outro, tendo sido declarada incapaz de governar e afastada do trono. Passou a viver recolhida e apenas era vista em público na companhia de outras damas.
Quando o povo assim a via, comentava “lá vai D. Maria com as outras”. Hoje, a expressão aplica-se a uma pessoa que não tem opiniões próprias e que segue apenas o que os outros lhe dizem.
13. Fila indiana
A expressão tem origem no modo de caminhar dos índios americanos quando se deslocavam, encobrindo as pegadas dos que seguiam à frente.
14. Testa de ferro
O rei do Chipre e de Jerusalém, o Duque Emanuel Filiberto di Savoia, era conhecido como Testa de Ferro. Apesar do título, não tinha nenhum poder verdadeiro. Daí ficou a expressão, atribuída hoje a alguém que aparentemente é responsável por uma empresa ou negócio sem que efetivamente o seja.
15. Não entender patavina
Ao que parece, Tito Lívio, natural de Patávio (hoje conhecida como Pádua, na Itália) comunicava-se num latim horroroso, originário desta região, e que era de difícil compreensão para os demais. Daí surgiu o Patavinismo, que significava não entender Tito Lívio. Hoje, a expressão é usada quando não entendemos nada sobre determinado assunto.
16. Lágrimas de crocodilo
Quando um crocodilo come, faz uma forte pressão contra o céu da boca, comprimindo as glândulas lacrimais. Assim, chora enquanto devora a vítima. Por essa razão, a expressão significa “choro fingido”.
17. Onde Judas perdeu as botas
Depois de trair Jesus e receber os seus 30 dinheiros, Judas acabou por se suicidar, enforcando-se numa árvore. No entanto, matou-se sem as botas, e os 30 dinheiros não foram encontrados com ele. Assim, os soldados partiram em busca das botas de Judas, onde se supunha estar o dinheiro. Atualmente, a expressão designa um lugar inacessível e remoto.
18. Andar à toa
Uma toa é a corda que reboca uma embarcação a outra, sendo que um navio que está à toa não tem rumo nem leme, indo para onde o navio que o reboca quiser. O ditado significa assim andar sem destino, apenas a passar o tempo.
19. Como sardinha em lata
As sardinhas, quando enlatadas em óleo ou noutro tipo de molho, costumam vir coladas umas às outras. Assim se criou a expressão, que se costuma usar para designar a superlotação dos transportes públicos.
20. Estar com a corda ao pescoço
O enforcamento foi (e ainda é) uma das formas mais comuns de aplicar uma pena de morte. Por vezes, o perdão pelo crime surgia já quando o condenado tinha a corda ao pescoço, estando prestes a ser executado. Assim, a expressão significa hoje estar ameaçado, sob pressão ou com problemas financeiros.
21. Amigo da onça
O termo parece ter surgido a partir da história de um caçador mentiroso que, ao ser surpreendido sem armas por uma onça, deu um grito tão forte que o animal fugiu. Como ninguém acreditava na sua história, o caçador perguntou se o interlocutor era amigo dele ou amigo da onça. Atualmente, esta expressão designa alguém hipócrita ou um falso amigo.
22. De pequenino é que se torce o pepino
Para que os pepinos se desenvolvam, os agricultores têm de lhes dar forma, retirando uns “olhinhos” que, se não forem removidos, fazem com que o pepino não cresça da melhor forma e adquira um gosto desagradável. Por analogia, tal como se molda os pepinos, também é preciso moldar o carácter das crianças desde tenra idade.
23. Cor de burro quando foge
Originalmente, a frase era “corre do burro quando ele foge”, o que faz sentido, já que um burro enraivecido pode ser perigoso. A tradição oral acabou por modificar a frase até à expressão que usamos hoje.
24. Favas contadas
Para se votar antigamente, usavam-se favas brancas e pretas, que significavam respectivamente sim ou não. Cada votante colocava a fava na urna, sendo que quem tivesse mais favas brancas ganhava. Hoje, a expressão é usada para designar algo certo, um negócio seguro.