Portugal tem quase 900 anos de história, rica em feitos gloriosos e nomes sonantes que se eternizaram como heróis. Mas temos também pessoas que cometeram ações horríveis, e que ficaram para a história pelas piores razões, embora não sejam tão conhecidas junto do grande público. Um desses casos é o de Luísa de Jesus, a última mulher portuguesa a ser condenada à morte e enforcada pelos seus crimes.
Luísa nasceu em Figueira do Lorvão, em dezembro de 1748. Era filha de Manoel Rodrigues e de Marianna Rodrigues, uma família de classe baixa. Luísa trabalhava como recoveira, percorrendo as aldeias para fazer compra e venda de mercadorias.
A sua infância não parece ter sido muito diferente do costume para a época, não sendo ela vítima de maus-tratos ou de algo que fizesse prever o seu comportamento no futuro. E que comportamento era esse? Pois bem, Luísa de Jesus foi apontada como a primeira assassina em série portuguesa, tendo cometido crimes hediondos contra crianças.
![Roda dos Enjeitados](https://www.vortexmag.net/wp-content/uploads/2018/03/CONVENTO-DE-S.-BENTO-DE-AVÉ-MARIA-RODA-DOS-EXPOSTOS-CONVENTO-DE-S.-BENTO-DE-AVÉ-MARIA-808x1024.jpeg)
Na época, era comum existirem casas com uma “Roda dos Enjeitados”, um dispositivo de madeira cilíndrico, muito comum em conventos e hospitais. O dispositivo era dividido ao meio e giratório. De um lado, as mães colocavam os bebés, abandonando a criança com privacidade. Depois, tocavam a uma sineta para avisar que lá estava um bebé, para que a criança recebesse logo a atenção que merecia.
Na Casa da Roda de Coimbra, eram abandonadas 200 crianças por ano. Apesar dos esforços da instituição, metade estava condenada a morrer, e muitas poucas tinham a sorte de encontrar o carinho de uma família. Como incentivo à adoção, havia a oferta de 600 réis, além de um enxoval e meio metro de tecido grosso de algodão a quem levasse uma criança para a sua casa.
Como trabalhava como recoveira, Luísa conhecia muitas pessoas e conhecia diversas casas. Assim, ia buscar crianças e bebés à Casa da Rode de Coimbra, supostamente em nome de outras famílias, comprometendo-se a entregá-las aos supostos adotantes. No total, “adotou” 34 crianças, todos nesta casa. Mas as intenções dela não eram boas: asfixiava as crianças com as próprias mãos, mal se encontrava sozinha com elas.
Seguia depois em direção ao Monte-Arroio, a poucos metros da Roda, onde os enterrava. Por vezes, levava os corpos para o seu casebre, onde os desmembrava, colocando pedaços num pote e guardando-os debaixo da palha ou em buracos no chão.
![Luísa de Jesus](https://www.vortexmag.net/wp-content/uploads/2022/09/696018-1-min-769x1024.jpg)
Por cada criança, ela desembolsava os 600 réis, entre outras coisas, o que dá um total de 20 mil réis, valor elevado que representava o equivalente ao ordenado de seis meses de uma cozinheira ou ao ordenado de um ano de uma moça de cozinha do Hospital Real das Caldas.
Fornecia nomes e endereços falsos à diretora da Roda, Leocádia Maria da Conceição, e à ama Margarida Joaquina, que confiavam na veracidade das suas afirmações sem nunca confirmarem a sua veracidade.
A 1 de abril de 1772, os crimes de Luísa de Jesus chegaram ao fim, quando a freira Angélica Maria tropeçou num cadáver que se encontrava mal enterrado, no Monte-Arroio.
Foram realizadas escavações e descobriram-se mais dois bebés no local, com marcas de estrangulamento. As suspeitas recaíram sobre Luísa, que foi interrogada a 6 de abril e confessou ter assassinado os 3 bebés encontrados.
Apesar da confissão, as autoridades decidiram continuar a investigação, tendo descoberto que a mulher tinha conseguido adotar diversas crianças, tendo supostamente servido de intermediária, embora nenhum bebé tivesse chegado ao seu destino.
A diretora da Roda e a ama foram presas, pelo que hoje chamaríamos de “negligência criminosa”, mas foram logo libertadas. Também foi preso o advogado Pascoal Luís Ferreira da Silva, que tinha chegado a atestar a veracidade dos dados fornecidos por Luísa. Também ele seria libertado pouco depois, por falta de provas no envolvimento nos crimes.
Entretanto, prosseguiam as escavações no Monte-Arroio, e o número de bebés encontrados foi assustador. A 18 de abril, Luísa tinha confessado o seu envolvimento na morte de mais 7 crianças, mas já tinham sido descobertos 15 cadáveres. Mais tarde, Luísa confessou ter morto mais 9 bebés, mas negou o seu envolvimento nas outras mortes.
Mas as descobertas macabras não ficaram por aqui. Após uma busca à sua casa, foram encontrados 18 corpos de bebés, oito deles desmembrados e distribuídos em potes, e os restantes 10 enterrados.
Portanto, foram encontrados 33 corpos no total. Luísa de Jesus adotou 34 crianças, mas nunca se descobriu o paradeiro da 34ª criança. Luísa só confessou ter asfixiado 28 dos bebés.
Recebeu severa sentença a 1 de julho, tendo-se tornado a última mulher a receber a pena de morte em Portugal. Segundo os juízes, nunca no nosso país se viu “um monstro de coração tão perverso e corrompido”.
Assim, Luísa foi condenada a percorrer as ruas com uma corda ao pescoço, enquanto os seus crimes eram lidos em voz alta. Depois, foi queimada com uma tenaz em brasa, e teve as suas mãos decepadas.
Por fim, acabou por falecer no garrote, e o seu cadáver foi queimado pouco depois. Luísa de Jesus tinha apenas 24 anos quando deu o seu último suspiro, mas deixou um legado negro de morte e de terror que ficou para a história pelos piores motivos.