Imagine que vive numa pequena aldeia rodeada de montanhas, onde se dedica à produção e ao comércio de mantas de lã. Para se proteger da concorrência e negociar melhor os seus produtos, cria um código secreto com os seus colegas, baseado em palavras e expressões do seu dia-a-dia. Com o tempo, esse código torna-se numa língua própria, que usa para falar com a sua família, os seus amigos e os seus vizinhos. Essa língua é o mindérico.
Trata-se de uma língua falada em Minde, uma freguesia portuguesa do distrito de Santarém, desde o século XVIII. É uma língua independente do português, com um vocabulário e uma gramática próprios. Tem um código ISO 639-3 DRC e é considerada uma língua ameaçada de extinção pela UNESCO.
Neste artigo, vamos conhecer melhor a história, as características e a situação atual do mindérico, bem como os projetos que existem para o revitalizar e divulgar.
A história do mindérico
O mindérico nasceu como um código secreto dos fabricantes e comerciantes das mantas de Minde, um produto típico da região. As mantas de Minde são feitas de lã de ovelha, tingida com cores naturais e tecida em teares manuais. Eram usadas para cobrir as camas, as portas e as janelas, para se proteger do frio e da humidade.
Os comerciantes de mantas viajavam por todo o país e até ao estrangeiro, levando consigo as suas mercadorias. Para se comunicarem entre si sem revelarem os seus segredos comerciais, usavam um código baseado em palavras e expressões do seu quotidiano, que só eles conheciam. Assim, podiam falar sobre os preços, as qualidades, os clientes e os concorrentes, sem serem entendidos pelos outros.
Com o passar do tempo, esse código foi-se tornando numa língua própria, que ultrapassou as barreiras do secretismo e alargou-se a todos os grupos sociais da comunidade minderica. O idioma passou a ser usado em todos os contextos sociais, não só para o negócio, mas também para a família, a religião, a cultura e o lazer.
As características do mindérico
O mindérico é uma língua que se distingue do português em vários aspectos. Tem um vocabulário rico e criativo, que reflecte a realidade e a cultura dos seus falantes. Muitas palavras têm origem em imagens do quotidiano, que passam de forma figurativa para a linguagem. Por exemplo, “piação” significa língua ou fala, porque os falantes de mindérico eram chamados de “charales”, que são pássaros que piam muito.
Outras palavras resultam de alterações do português vernáculo ou de desenvolvimentos próprios do mindérico. Por exemplo, “cambalhota” significa cabeça, porque é a parte do corpo que dá voltas quando se faz uma cambalhota.
Apresenta uma gramática própria, que difere do português em vários aspectos. Por exemplo, tem três géneros gramaticais: masculino, feminino e neutro. O neutro é usado para se referir a coisas ou conceitos abstratos, como o tempo, o amor ou a morte.
Tem também um sistema de casos gramaticais, que indica a função das palavras na frase. Por exemplo, o caso nominativo indica o sujeito, o caso acusativo indica o objeto direto e o caso dativo indica o objeto indireto.
Tem ainda uma pronúncia e uma ortografia próprias, que se baseiam no som das palavras e não na sua origem. Por exemplo, a letra “h” é usada para representar o som de “r” forte, como em “hato” (rato) ou “hosa” (rosa). A letra “x” é usada para representar o som de “ch”, como em “xapéu” (chapéu) ou “xave” (chave).
A situação atual do mindérico
O mindérico é uma língua que está em vias de extinção. Segundo o Atlas UNESCO das Línguas em Perigo no Mundo, existem cerca de mil falantes, na sua maioria adultos ou idosos.
A língua não é transmitida às novas gerações, que preferem usar o português ou outras línguas mais prestigiadas. Além disso, sofre com a perda de falantes, a falta de reconhecimento oficial, a escassez de materiais didáticos e a ausência de meios de comunicação.
No entanto, existem alguns esforços para preservar e revitalizar este idioma tanto por parte da comunidade de falantes como por parte de instituições académicas e culturais. Por exemplo:
- Existem cinco edições de um glossário minderico, onde se encontram as palavras traduzidas de português para minderico e minderico para português. A edição de 2004, a mais completa e atual, está disponível no Centro de Artes e Ofícios Roque Gameiro.
- O Centro Interdisciplinar de Documentação Linguística e Social (CIDLeS), um centro de investigação que se dedica ao estudo e documentação de línguas ameaçadas na Europa e ao desenvolvimento de tecnologias da linguagem para línguas menos usadas, é a instituição que tem trabalhado na documentação linguística e divulgação do minderico, bem como na sua revitalização, em colaboração direta com a comunidade de falantes.
- Existem aulas no Centro de Artes e Ofícios Roque Gameiro para as várias faixas etárias, onde se ensina a língua, a cultura e a história dos mindericos. As aulas são gratuitas e abertas a todos os interessados.
- Existem também iniciativas culturais que promovem o uso e a valorização do mindérico, como festivais, exposições, livros, filmes, músicas e peças de teatro. Por exemplo, o Festival do Mindérico é um evento anual que celebra a língua e a cultura mindericas, com atividades para todas as idades.
Perguntas frequentes
O que é o mindérico?
O mindérico é uma língua falada em Minde, uma freguesia portuguesa do distrito de Santarém. É uma língua independente do português, com um vocabulário e uma gramática próprios. Nasceu como um código secreto dos comerciantes de mantas de Minde, mas tornou-se uma língua do quotidiano.
Quantos falantes tem o mindérico?
O mindérico tem cerca de mil falantes, na sua maioria adultos ou idosos. A língua está em vias de extinção, pois não é transmitida às novas gerações.
Como se aprende mindérico?
Uma forma de aprender o idioma é frequentar as aulas de minderico no Centro de Artes e Ofícios Roque Gameiro, onde se ensina a língua, a cultura e a história dos mindericos. As aulas são gratuitas e abertas a todos os interessados.
Outra forma é consultar o glossário minderico, onde se encontram as palavras traduzidas de português para minderico e minderico para português. A edição de 2004, a mais completa e atual, está disponível no Centro de Artes e Ofícios Roque Gameiro.
Também se pode aprender a língua através de iniciativas culturais que promovem o uso e a valorização da língua, como festivais, exposições, livros, filmes, músicas e peças de teatro.
Conclusão
O mindérico é uma língua única e fascinante, que revela a história, a cultura e a identidade dos mindericos. É uma língua que merece ser conhecida, respeitada e preservada, pois faz parte do património linguístico e cultural de Portugal e da humanidade. Se quiser saber mais sobre este idioma, visite Minde e descubra esta língua e esta comunidade tão especiais.