Pode parecer estranho, mas sabia que os principais símbolos turísticos de Turim se deveram ao trabalho de um português? Alfredo d’Andrade ocupou diversos cargos importantes em Itália, e a sua obra ainda vive em diversas construções, como o castelo e núcleo medieval de Turim, que foram construídos no séc. XIX, como cenários para uma exposição mundial.
Alfredo d’Andrade restaurou e reconstruiu um grande número de monumentos italianos, apagando as marcas de anteriores restauros desastrosos, e construindo até locais de raiz, como o já mencionado castelo em Turim, que após a exposição se tornou atração turística permanente. Destacam-se no seu currículo a reconstrução da Torre de Pailleron, os castelos de Montalto-Dora e Fenis, o palácio de S. Jorge e a Porta Soprana, em Génova, o castelo de Pavone Canavese, e a Sacra de S. Miguel, no vale de Susa. Em Turim, cidade da qual se tornou cidadão honorário, foi igualmente responsável por trazer de novo o esplendor à Porta Palatina.
A lista de cargos ocupados por este lisboeta, nascido em 1839 e embarcado aos 14 anos para Itália, para aprofundar os estudos, é extensa. Foi superintendente dos monumentos de Piemonte e Ligúria, membro do Conselho Superior de Antiguidades e de várias comissões artísticas para restauro de monumentos em diversos locais italianos. Fez parte dos grupos de avaliação artística ao monumento a Vítor Emanuel II, à edificação do sepulcro do rei Umberto, e da reconstrução da basílica de São Marcos, em Veneza, entre outros cargos importantes.
Em Portugal, a sua obra mais conhecida é o chalet de Fontalva, mas Alfredo d’Andrade foi também responsável pelo alargamento do Terreiro do Paço, em 1857. O museu do Chiado guarda pelo menos uma pintura sua. O restante espólio é gerido por uma fundação e pode ser visitado no museu de Pavone Canavese.
Alfredo d’Andrade foi alvo de diversas homenagens, tanto em vida como postumamente, e ainda hoje o seu trabalho é considerado pioneiro, sendo temas de conferências, estudos, trabalhos e colóquios. O seu trabalho é uma amostra de como os restauros podem ser feitos, ao contrário de trabalhos feitos noutros países, Portugal incluído. As opções estéticas de restauros são frequentemente contestadas, já que implicam muitas vezes a recriação da traça ao gosto de épocas diferentes, ou partem de uma suposta recriação de características originais.
Em Portugal, por exemplo, existem diversos monumentos cuja atual aparência se deve a restauros nos séculos XIX e XX. A ala oeste do Mosteiro dos Jerónimos, onde se encontram o Museu da Marinha e o Museu de Arqueologia, são obra oitocentista, bem como o portal e dois torrões que ladeiam a entrada do primeiro museu.
Transformações igualmente controversas foram as da Sé de Lisboa, que ganhou torreões antes inexistentes, o Paço de Guimarães, que foi praticamente construído do zero, e o castelo de S. Jorge, que, segundo piada da época, nem o próprio Martim Moniz, que ali terá morrido, reconheceria.
Mas não é apenas em Lisboa que isto acontece e, aliás, a grande maioria dos portugueses desconhece a história real dos monumentos mais emblemáticos de Portugal. Quem viajasse pelo país no início do século XX, dificilmente veria castelos ou outras construções antigas. Estavam quase todas em ruínas, muitos deles irreconhecíveis.
Em alguns casos, esses castelos (e outros monumentos) eram utilizados para outros fins. O castelo de Chaves, por exemplo, chegou a funcionar como prisão. E existem casos em que eram utilizados como armazéns, fábricas ou até estábulos para gado. Havia também o hábito de recolher as pedras desses monumentos e utilizá-las na construção de novos edifícios.
O estado de completo abandono da maioria dos monumentos portugueses levou a que o governo da altura optasse por reconstruí-los. Mas surgiram 2 problemas fundamentais: em alguns casos não existiam documentos que detalhassem com exatidão como eram esses monumentos quando foram construídos e em outras situações, a reconstrução foi feita com muito amadorismo.
O certo é que, passado umas décadas, toda a gente parece aceitar como válidas essas reconstruções, muito por causa de desconhecerem o aspeto inicial desses monumentos e a história dos mesmos. De qualquer das formas, feitas com profissionalismo ou não, as reconstruções dos monumentos portugueses foram muito importantes e trouxeram alguma dignidade a estes testemunhos da história de Portugal.