Braga, uma das mais antigas cidades de Portugal, é um verdadeiro tesouro histórico. Com origens romanas e mais de dois milénios de existência, a cidade, outrora chamada Bracara Augusta, guarda entre as suas ruas não só monumentos imponentes, mas também um património de lendas e histórias fascinantes.
Umas têm um fundo de verdade, outras são fruto da imaginação popular, mas todas elas refletem a alma deste lugar especial. Eis algumas das mais emblemáticas.
1. És de Braga, deixaste a porta aberta?
Se já ouviu esta expressão, saiba que a sua origem tem várias explicações – e nenhuma envolve desleixo! A mais conhecida remonta ao século XVI, quando o Arcebispo D. Diogo de Sousa mandou abrir a Porta Nova na muralha da cidade, sem instalar uma porta de madeira.
Esta decisão foi prática: a cidade já se expandia para além das muralhas e os tempos de guerra eram coisa do passado. No entanto, os bracarenses ficaram com a fama de serem descuidados.
Uma outra versão, mais encantadora, sugere que a comunidade minhota era tão unida que as pessoas não se preocupavam em trancar as portas de casa, permitindo que os vizinhos entrassem e saíssem como bem entendessem. Um espírito de camaradagem que, diga-se, ainda se encontra em algumas aldeias da região!
2. O fruto milagroso de São Geraldo
Todos os anos, a 5 de dezembro, Braga celebra o Dia de São Geraldo, o padroeiro da cidade e primeiro arcebispo. Nesse dia, a sua capela da Sé abre-se com uma decoração peculiar: altares cobertos de frutos. A origem desta tradição remonta a uma lenda marcante.
Conta-se que, gravemente doente numa aldeia gelada em pleno Inverno, São Geraldo pediu fruta para aliviar a febre. Na impossibilidade – estávamos em dezembro e as árvores estavam despidas –, insistiu para que procurassem.
Milagrosamente, as árvores em redor encheram-se de frutos, oferecendo sustento ao arcebispo. Desde então, este “milagre” é recordado todos os anos com esta colorida homenagem.
3. O amor altruísta de São Longuinho
No coração do Bom Jesus do Monte, um dos mais emblemáticos santuários de Braga, encontra-se a estátua de São Longuinho, envolta numa curiosa tradição. Durante as festas de São João, as raparigas solteiras costumam dar voltas à estátua, rezando para que o santo apresse os seus casamentos.
A lenda por detrás desta prática é comovente. Longuinho, um agricultor rico e bondoso, apaixonou-se por Rosinha, que, no entanto, amava outro homem. Ao aperceber-se da profundidade do amor entre Rosinha e Artur, Longuinho abdicou do seu interesse e tornou-se padrinho de casamento. Este gesto altruísta tornou-o um símbolo do verdadeiro amor e da generosidade.
4. Os mistérios do Bom Jesus: a Cruz e o Cálice
O Bom Jesus do Monte é palco de duas lendas que envolvem aparições misteriosas, ligando a fé popular à história de Portugal.
- A Cruz Celeste: Após a vitória portuguesa na Batalha do Salado, no século XIV, conta-se que uma cruz brilhante surgiu nos céus do Monte do Espinho, onde hoje se ergue o santuário. Em honra deste sinal divino, o arcebispo e os habitantes construíram uma cruz e uma pequena ermida.
- O Cálice da Restauração: Durante a independência de Portugal, em 1640, reza a lenda que apareceu um cálice radioso no Monte do Espinho, interpretado como um sinal de proteção divina. Este episódio reforçou a devoção ao Bom Jesus e a ideia de que a vitória sobre os espanhóis teve uma intervenção celestial.
Hoje, os peregrinos podem ver representações simbólicas deste cálice nos Escadórios dos Cinco Sentidos, um pormenor subtil que escapa ao olhar mais distraído.
Braga, com as suas lendas e tradições, é mais do que uma cidade histórica; é um lugar onde o passado e o imaginário popular se cruzam de forma mágica. Cada história, verdadeira ou não, é um convite a conhecer melhor o coração desta cidade vibrante e a alma das suas gentes. Afinal, quem não gosta de uma boa história?