A história da Península Ibérica está repleta de povos que, ao longo dos séculos, moldaram a identidade da região. Entre eles, os Cónios destacam-se como uma das civilizações mais enigmáticas e fascinantes.
Habitantes do território que hoje corresponde ao Alentejo e Algarve, prosperaram entre o século VIII a.C. e o século I d.C., até à sua integração na província romana da Lusitânia. Apesar de serem pouco conhecidos, deixaram marcas culturais e linguísticas que perduram até aos dias de hoje.
A origem dos Cónios continua a ser um tema de debate entre historiadores e arqueólogos. Diferentes teorias tentam explicar a sua proveniência e relação com outros povos antigos. Uma das hipóteses mais aceites sugere que se trataria de um povo indo-europeu, possivelmente ligado aos proto-célticos ou pré-célticos ibéricos, falantes de uma língua relacionada com as antigas línguas da Europa Ocidental.
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Outras interpretações apontam para uma origem lígure, associando-os a uma população que ocupava partes da Península Ibérica, França e Itália antes da chegada dos indo-europeus. Há ainda quem defenda que os Cónios faziam parte dos povos ibéricos autóctones, desenvolvendo-se a partir de contactos e migrações sucessivas na região.
Embora os vestígios arqueológicos sejam escassos, é possível inferir alguns aspetos da cultura cónia. Eram uma sociedade essencialmente rural, dedicada à agricultura, à pastorícia e à pesca. As suas aldeias eram compostas por habitações circulares de pedra, madeira e barro, e não apresentavam grandes fortificações.
A organização social dos Cónios baseava-se em tribos ou clãs liderados por chefes, escolhidos por eleição ou linhagem. Em vez de uma estrutura política centralizada, pareciam funcionar como uma confederação de tribos independentes que, conforme as circunstâncias, se aliavam ou entravam em conflito.
A religião cónia permanece um mistério, mas acredita-se que praticavam um politeísmo baseado na veneração de divindades associadas à natureza e aos ciclos agrícolas. Os seus rituais decorriam em locais sagrados como templos, pedras votivas e fontes, alguns dos quais foram posteriormente aproveitados pelos romanos, como é o caso das ruínas de Milreu (Faro) e Pisões (Beja).
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Um dos legados mais intrigantes dos Cónios é a sua escrita, conhecida como “escrita do sudoeste”. Trata-se de um sistema alfabético derivado do alfabeto fenício, adaptado às necessidades da língua cónia. As inscrições eram feitas em pedra ou metal, com uma orientação geralmente da direita para a esquerda, e, por vezes, alternavam entre linhas horizontais e verticais.
Os vestígios escritos revelam nomes próprios, referências a divindades e algumas palavras ligadas à guerra, como “arco”, “lança” e “espada”. No entanto, grande parte da língua cónia continua indecifrável, sendo alvo de estudo por parte dos linguistas e arqueólogos.
Os Cónios não viveram isolados. Mantiveram relações com diversos povos da Península Ibérica e do Mediterrâneo, tanto comerciais como militares. Um dos povos com quem interagiram foram os Lusitanos, habitantes da parte central e ocidental da Península Ibérica. Os conflitos entre ambos são documentados, destacando-se a destruição da cidade cónia de Conistorgis pelos Lusitanos. A localização exacta desta cidade é ainda incerta, sendo apontados locais como Castro Verde, Almodôvar ou Mértola.
Os Cónios estabeleceram também contactos com os Tartessos, uma civilização avançada do sul da Península Ibérica, conhecida pelo comércio de metais preciosos e uma escrita própria que alguns especialistas relacionam com a dos Cónios. Esta influência manifestou-se na arte, religião e práticas comerciais cónias.
As ligações ao mundo mediterrânico foram igualmente significativas. Os Cónios mantiveram trocas comerciais com os Fenícios, Cartagineses e Romanos, aproveitando o comércio de produtos como os metais, a cerâmica e os bens alimentares.
Contudo, também enfrentaram pressões externas, resistindo à expansão cartaginesa no século III a.C., mas acabando por ser assimilados pelo domínio romano no século II a.C.
Apesar de a civilização cónia ter sido absorvida pelo Império Romano, a sua herança cultural perdura de diferentes formas. A “escrita do sudoeste”, por exemplo, continua a intrigar os investigadores que tentam decifrar o seu significado e ligações a outras línguas antigas da Península Ibérica.
No plano etnográfico, algumas tradições populares do sul de Portugal podem ter raízes na cultura cónia. Lendas sobre mouras encantadas, danças rituais e festividades associadas à natureza podem refletir antigas crenças e práticas deste povo enigmático.
Os Cónios foram um exemplo de uma civilização que soube adaptar-se e interagir com outras culturas sem perder a sua identidade. O seu legado, embora envolto em mistério, continua a ser uma peça fundamental da história do território a que hoje chamamos Portugal. Explorar o passado dos Cónios é, em última instância, descobrir mais sobre as nossas próprias origens.
Vale a pena uma visita ao Museu da Escrita do Sudoeste, em Almodôvar!
O nome de Conímbriga não terá sido dado pelos romanos por ser terra de Cónios?
Assim, em vez de dizermos que os Lusitanos são os antepassados dos Portugueses, seria mais acertado dizer que os Portugueses do Sul são descendentes de Cónios, os do Centro, de Lusitanos e os do Norte, de Galaicos.