Quem eram os cónios? Onde viviam? Como se relacionavam com os outros povos da Península Ibérica? Estas são algumas das perguntas que podemos fazer sobre este povo misterioso que habitou no Alentejo e no Algarve, entre o século VIII a.C. e o século I d.C., até serem integrados na província romana da Lusitânia.
Os cónios são um dos povos pré-históricos mais desconhecidos da nossa história, mas também um dos mais fascinantes. Apesar de terem deixado poucos vestígios materiais, tiveram uma influência cultural e linguística importante na região onde se estabeleceram, e que ainda hoje podemos reconhecer em alguns aspectos.
Neste artigo, vamos tentar desvendar um pouco mais sobre os cónios, a sua origem, cultura, língua e legado. Vamos também ver como se relacionaram com os outros povos da Península Ibérica, como os lusitanos, os tartessos, os fenícios, os cartagineses e os romanos.
A origem dos cónios
A origem étnica dos cónios é uma questão controversa e ainda não totalmente esclarecida. Existem várias teorias que tentam explicar a sua proveniência e a sua relação com outros povos antigos.
Uma das teorias mais aceites é a de que seriam um povo indo-europeu, ou seja, que falavam uma língua derivada de uma família linguística comum que se originou na Ásia Central ou na Anatólia. Dentro desta família, os cónios poderiam pertencer ao ramo céltico, proto-céltico ou pré-céltico ibérico.
Outra teoria é a de que eram um povo lígure, ou seja, que pertenciam a um grupo de povos que habitavam na Europa Ocidental antes da chegada dos indo-europeus. Os lígures teriam ocupado grande parte da Península Ibérica, França e Itália, e teriam uma origem pré-indo-europeia ou não indo-europeia.
Há ainda quem defenda que os cónios eram um povo ibérico, ou seja, que faziam parte de um conjunto de povos autóctones da Península Ibérica, que falavam línguas diferentes entre si, mas com algumas semelhanças. Os ibéricos teriam uma origem mista, resultante de vários contactos e migrações ao longo dos tempos.
A cultura deste povo é difícil de caracterizar, pois há poucos vestígios arqueológicos que nos permitam conhecer o seu modo de vida. No entanto, podemos inferir alguns aspectos com base nas fontes escritas e nas comparações com outros povos da época.
Seriam um povo essencialmente rural, que se dedicava à agricultura, à pastorícia e à pesca. Viviam em aldeias dispersas pelo território, sem grandes fortificações ou centros urbanos. As suas casas eram simples e circulares, feitas de pedra, madeira ou barro. A sua alimentação baseava-se nos produtos da terra e do mar, como cereais, legumes, frutas, carne, leite, mel, peixe e marisco.
Tinham uma organização social baseada em tribos ou clãs familiares, liderados por um chefe que era escolhido por eleição ou por herança. Os cónios não tinham uma unidade política, mas sim uma confederação de tribos independentes, que por vezes se aliavam ou se confrontavam entre si.
Praticavam uma religião que se supõe ter sido politeísta, ou seja, que acreditavam em vários deuses e deusas. No entanto, não se conhecem com certeza os nomes ou as funções dessas divindades. Os cónios realizavam rituais religiosos em lugares sagrados, como santuários, templos, altares, pedras e fontes. Alguns destes locais sagrados foram posteriormente aproveitados pelos romanos, como são os casos das ruínas de Milreu, em Faro, e Pisões, em Beja.
A língua dos cónios
A língua dos cónios é outro aspecto que nos intriga e nos fascina. Infelizmente, não temos muitos testemunhos escritos dessa língua, apenas algumas inscrições em pedra ou metal, que nos permitem ter uma ideia geral do seu sistema de escrita e do seu vocabulário.
A escrita era do tipo alfabético, ou seja, que usava símbolos para representar os sons da língua. Esses símbolos eram derivados do alfabeto fenício, que foi adaptado pelos cónios às suas necessidades. Era feita da direita para a esquerda, e às vezes alternava entre linhas horizontais e verticais.
O vocabulário era composto por palavras que nos revelam alguns aspectos da sua cultura e da sua religião. Por exemplo, podemos identificar alguns nomes próprios de pessoas e de deuses. Também podemos reconhecer algumas palavras relacionadas com a guerra, como arco (arcu), lança (lancea) ou espada (falcatum).
As relações dos cónios com os outros povos
Os cónios não estavam isolados no seu território, mas mantinham relações com os outros povos da Península Ibérica e do Mediterrâneo. Essas relações podiam ser de cooperação ou de conflito, dependendo dos interesses e das circunstâncias.
Um dos povos com quem tiveram mais contacto foram os lusitanos, outro povo pré-histórico que habitou na parte central e ocidental da Península Ibérica. Os cónios e os lusitanos tinham origens e culturas diferentes e por vezes entraram em contacto e em conflito.
Por exemplo, os lusitanos destruíram a cidade principal dos cónios, Conistorgis, que em língua cónia significaria “Cidade Real”, por estes se terem aliado aos romanos durante a conquista romana da Península Ibérica. A localização exacta desta cidade ainda não foi descoberta, mas existem várias hipóteses, como Castro Verde, Almodôvar ou Mértola.
Outro povo com quem os cónios tiveram contacto foram os tartessos, um povo que se desenvolveu no sul da Península Ibérica, entre os séculos IX e VI a.C., e que atingiu um elevado grau de civilização. Os tartessos eram famosos pelo seu comércio de metais preciosos, como o ouro e a prata, e pela sua escrita própria, que alguns autores relacionam com a escrita dos cónios. Os tartessos influenciaram a cultura dos cónios, especialmente na arte e na religião.
Os cónios também tiveram relações com os povos do Mediterrâneo, como os fenícios, os cartagineses e os romanos. Estes povos estabeleceram colónias e entrepostos comerciais no litoral da Península Ibérica, e entraram em contacto com os cónios, trocando produtos e ideias.
Os cónios beneficiaram do comércio com estes povos, mas também sofreram a sua pressão e dominação. Resistiram à invasão cartaginesa no século III a.C., mas acabaram por se submeter à conquista romana no século II a.C.
O legado dos cónios
O legado dos cónios é um património cultural e histórico que devemos valorizar e preservar. Apesar de terem sido assimilados pelos romanos no século I d.C., deixaram a sua marca na região onde habitaram, e que ainda hoje podemos reconhecer em vários aspectos.
Um desses aspectos é a escrita do sudoeste, uma forma de escrita alfabética que foi utilizada no sudoeste da Península Ibérica entre os séculos VII e V a.C. A escrita do sudoeste é considerada por alguns autores como uma escrita cónia, por estar relacionada com o povo e a cultura que a criou. Outros autores preferem designá-la como escrita tartéssica ou turdetana, por estar associada à cultura tartéssica que se desenvolveu no sul da Península Ibérica.
A escrita do sudoeste é composta por cerca de 30 signos que representam os sons da língua dos cónios ou de um povo próximo. A maioria das inscrições em escrita do sudoeste são estelas funerárias que registam o nome do defunto e a sua genealogia. Esta linguagem é ainda um mistério para os estudiosos, que tentam decifrar o seu significado e a sua origem.
Outro aspecto é a etnografia, ou seja, o estudo das tradições e costumes populares. Alguns elementos da cultura popular do sul de Portugal podem ter origem na cultura dos cónios, como as lendas sobre mouras encantadas (que podem estar relacionadas com as deusas cónias), as danças rituais (que podem ter um significado simbólico originário dos ritos cónios), ou as festas populares (que podem ter origem nas celebrações cónias).
Conclusão
Os cónios foram um povo pré-histórico que habitou no Alentejo e no Algarve, e que nos deixou um legado cultural e histórico que merece ser conhecido e valorizado. Apesar de terem sido assimilados pelos romanos, mantiveram a sua identidade e a sua língua durante séculos, e influenciaram a cultura e a paisagem da região onde se estabeleceram.
Foram um exemplo de um povo que soube adaptar-se às mudanças históricas, mas sem perder a sua essência e a sua originalidade. São também um exemplo de um povo que nos inspira a conhecer melhor as nossas raízes e a nossa história.
Boa tarde,
É com satisfação que aprendo mais qualquer coisa sobre a nossa cultura, desconhecia por completo a existência do povo/tribo Cónio. Obrigado.
Mais um dado, espero que real e cientifico.
As nossas origens como povo, deve ser bem estudado, pois temos necessidade de nos conhecer.
Conhecer o passado, analisar o presente para ter mos futuro como povo, ainda quero acreditar.
Obrigado pelo artigo.