Corria o ano de 1918, e, durante muitos dias, um cruzeiro com a imagem de Cristo (que viria a ser conhecido com o Cristo das Trincheiras), situado próximo de Neuve-Chapelle, fez companhia às tropas portuguesas que participavam na 1ª Guerra Mundial. Foi alvo de devoção, ouviu preces e deu ânimo aos homens que aguardavam mais um confronto, que seria a batalha de La Lys, a 9 de abril, e que se revelou fatal.
A imagem do Cristo crucificado estava numa intersecção de estradas, no sector português da Flandres, entre as localidades de Lacouture e Neuve-Chapelle. A figura era uma companhia diária dos soldados portugueses e, tal como eles, sofreu duramente com a ofensiva alemã de 9 de Abril de 1918, que ficou conhecida como a Batalha de la Lys.
No final dos bombardeamentos, a imagem perdera uma das mãos, parte das pernas, ambos os pés e tivera o peito atravessado por uma bala. Neuve-Chapelle tinha sido quase varrida do mapa, os mortos portugueses ascendiam a mais de 7500, mas o Cristo, ainda que mutilado, continuava no seu lugar.
A zona foi bombardeada e totalmente destruída pelos inimigos, deixando apenas cadáveres, homens a agonizar, escombros, e a imagem de Cristo, embora mutilada. Faltava as pernas e parte do braço direito à figura, mas tornou-se mesmo assim um símbolo de resistência, sobrevivência e ânimo, apesar de a batalha se ter revelado uma das mais sangrentas da história do nosso país, precedida apenas pela batalha de Alcácer Quibir. Todos os militares do Corpo Expedicionário Português acabaram por morrer, ficar feridos ou ser aprisionados em consequência da batalha de La Lys.
Ao recuarem levando os seus mortos e feridos, os homens do Corpo Expedicionário Português carregaram também com o Cristo do cruzeiro de Neuve Chapelle, agora designado Cristo das Trincheiras. Na lama da Flandres, Cristo sofria e morria nas trincheiras, tal como acontecia aos filhos dos camponeses de Portugal.
É quase inimaginável que, debaixo das barragens de artilharia alemãs, que dizimaram grande parte do contingente português, a opção de alguns militares fosse a de trazer consigo a imagem de Cristo, severamente danificada, e a colocassem em local seguro onde pudesse ser novamente venerada.
Mais do que um episódio ocorrido durante a 1ª Guerra Mundial, o “Cristo das Trincheiras” simboliza a fé que manteve os militares portugueses na linha de frente durante um par de anos, praticamente sem apoios, mal abastecidos, sentindo-se abandonados por quem os enviou para combater por algo que a maioria não entendia.
Mais tarde, o Cristo foi recolocado no espaço original, e ali permaneceu durante mais duas décadas. Mas em 1958, por iniciativa do governo português, veio para Portugal, e a 9 de abril, numa cerimónia, foi colocado no Mosteiro de Santa Maria da Vitória, na Batalha, sobre a cabeceira do túmulo do Soldado Desconhecido, representação de todos os que morreram a lutar pela pátria e cuja identidade se desconhece.
Não deixa de ser irónico que estes dois símbolos de perda se encontrem num monumento que foi construído para celebrar uma grande vitória nacional.
A homenagem ao soldado desconhecido é composta pelos túmulos de dois militares (um morto na África Portuguesa, outro na Flandres), pela denominada “chama da pátria” e pelo Cristo da Trincheiras, com direito a guarda de honra permanente. O conjunto está situado na Casa do Capítulo, no Mosteiro da Batalha, que foi edificado para celebrar a vitória em Aljubarrota.
Acima deste memorial, ergue-se a abóbada, desafiando as leis da física, e também ela ligada a uma lenda. Segundo Alexandre Herculano, a abóbada foi desenhada pelo mestre Afonso Domingues. Apesar de ninguém acreditar que a abóbada resistiria, ele, já idoso, quase cego e às portas da morte, decidiu permanecer sozinho por baixo desta, com fé no seu projeto. E a verdade é que a abóbada ainda hoje se mantém estável, bem como o próprio Cristo das Trincheiras, sendo ambos símbolos de fé neste espaço de homenagem.
A batalha de La Lyz produziu o heroi soldado portugues que sozinho com uma metralhadora “lewis” manteve sua posiçao, enquanto o grosso da tropa recuava para posiçoes no interior, face ao violento araque alemao, contra as trincheiras defendidas pelos portugueses. Esta metralhadora, bem como a foto do combatente e descriçao do seu ato heroico, protegendo a retirada e posteriomente se juntando novamente com seu grupo, estao no Museu de Artilharia em Lisboa, junto a estaçao de comboios Santa Apolonia.