Se procura um destino especial na Madeira, onde a natureza se impõe em força e a história se revela em cada pedra, o Curral das Freiras é o sítio certo. O nome pode soar curioso — e até um pouco misterioso —, mas tudo se explica quando se conhece melhor esta pequena aldeia, escondida entre montanhas e fora do alcance do olhar dos invasores que, há séculos, atacavam a ilha.
A primeira imagem que a maioria dos visitantes tem do Curral das Freiras é lá do alto, a partir de miradouros como a Eira do Serrado, a Boca dos Namorados ou o Montado do Paredão.
É neste momento que se percebe a verdadeira singularidade do local: uma aldeia encaixada num vale profundo, protegida por imponentes picos rochosos e rodeada de paisagens quase cinematográficas.
Esta espécie de “cratera” natural foi esculpida ao longo de milhões de anos, com a ajuda da erosão, deslizamentos de terra e até um toque de intervenção humana. O resultado é um cenário que parece retirado de um conto de fadas — mas com um enredo muito real.
Durante os primeiros tempos da colonização da ilha, este vale era utilizado como pastagem. As montanhas formavam um curral natural para o gado — e daí o nome.
A história ganhou um novo capítulo no século XVI, quando as freiras do Convento de Santa Clara, no Funchal, fugiram para este local durante os ataques dos corsários franceses. Encontraram aqui um esconderijo perfeito, invisível do mar e protegido pelas montanhas. Desde então, ficou conhecido por Curral das Freiras.
Mas a ligação às freiras vai ainda mais longe. Foi também a partir dos cânticos religiosos que, em 1968, os investigadores redescobriram uma ave marinha raríssima — a freira da Madeira — que se pensava estar extinta. O som do animal fazia lembrar aos pastores locais o coro das religiosas que ali viveram. Coincidência ou não, o nome ficou.
Hoje em dia, o Curral das Freiras mantém a ligação às tradições e à vida rural. É comum encontrar pequenos terrenos cultivados, casas dispersas por fajãs com nomes quase poéticos — Fajã dos Cardos, Fajã Escura, Colmeal — e um forte orgulho pela história local.
Um dos momentos altos do ano é a Festa da Castanha, celebrada no início de novembro. Milhares de pessoas sobem à vila para provar iguarias típicas como o licor de castanha, as broas, as sopas, os bolos e até o pão feito com este ingrediente. A festa é um verdadeiro impulso para a economia da freguesia e uma montra dos sabores madeirenses.
Mais recente — e talvez menos conhecida — é a Mostra do Brigalhó, dedicada a um tubérculo endémico da Macaronésia. Requer uma cozedura de 24 horas, o que diz muito sobre os tempos de escassez que marcaram a história da região. A mostra decorre em maio e inclui provas, exposições e várias atividades promovidas pela comunidade.
Para quem gosta de caminhadas, o Curral é também um ponto de partida para percursos pedestres incríveis. O PR2 – Vereda do Urzal é uma das melhores opções. Tem cerca de 10 quilómetros, começa na Fajã dos Cardos e atravessa antigas rotas de ligação entre o sul e o norte da ilha. Outras rotas recomendadas passam pela Boca das Torrinhas, pela Levada do Curral e ainda pelo Pico Ruivo.
Com uma população a rondar os 2000 habitantes e uma área superior a 25 quilómetros quadrados, esta é a maior freguesia do concelho de Câmara de Lobos. E também uma das mais fascinantes. Entre a história, os sabores locais e a beleza natural, o Curral das Freiras é daqueles sítios que não se esquecem.