Já alguma vez se perguntou por que razão é que o rei D. Pedro I, que ficou na história de Portugal pelo seu romance arrebatador com Inês de Castro, acabou com o cognome de “o justiceiro” ou “o cruel”? A verdade é que este rei ficou conhecido não só por ter mandado arrancar o coração dos homens que assassinaram a sua amante, como também por fazer justiça pelas próprias mãos, um pouco por todo o país.
Certamente conhece o episódio bíblico em que o rei Salomão ordena que um bebé seja cortado a meio e repartido por duas mulheres que reclamam a sua maternidade, sendo que uma delas rejeita, horrorizada, mostrando ser a verdadeira progenitora. Pois Portugal teve o seu próprio Salomão, apesar de não tão sagaz.
D. Pedro I, nos 10 anos em que reinou, percorreu o país a fazer justiça pelas suas próprias mãos. O rei gostava de ouvir as histórias e queixas de quem tinha sido injustiçado e, em vez de recorrer aos tribunais próprios, proferia as sentenças e muitas vezes punha-as em prática. Assim, são diversas as histórias de justiça feita pelas próprias mãos a ele atribuídas.
Por exemplo, em Santarém vivia um lavrador rico, com quem o rei se dava. Estando D. Pedro nessa cidade e não tendo visto o homem, pergunta por ele e descobre que o filho o tinha atacado à facada, deixando-lhe uma cicatriz na cara.
Foi então que o rei mandou chamar o lavrador e lhe pediu que contasse como tudo se tinha passado. Após ouvir o relato do lavrador, D. Pedro ordena que a sua mulher e o seu filho sejam levados à sua presença.
Quando a mulher chegou, o rei pergunta-lhe de quem é o seu filho, tendo ela dito que era dela e do marido. “Não acredito”, respondeu o rei, “se o teu marido fosse o verdadeiro pai, ele não o teria acutilado daquela forma”.
A mulher admitiu que o rapaz era filho de um frade, que a tinha violado. Assim, no dia seguinte, o rei foi ouvir missa na igreja onde a violação tinha ocorrido e, concluída a cerimónia, mandou chamar o religioso.
Após uma curta e acesa troca de palavras, D. Pedro manda colocar o violador num caixote e serrá-lo a meio, tendo o frade sofrido uma morte horrorosa. Mas esta é apenas uma das muitas histórias atribuídas a este rei.
Outro episódio curioso protagonizado por ele envolve o seu castigo ao bispo do Porto. Chegou aos ouvidos do rei que este prelado tinha relações íntimas com uma mulher casada. Apesar de não haver provas, foi o que bastou para que ele entrasse pelo paço episcopal adentro e, pegando num chicote, o punisse.
Noutro episódio, condenou uma mulher à morte por saber que ela enganava o marido, e mandou executar essa sentença, mesmo estando o enganado a implorar de joelhos pelo perdão da esposa.
A juntar a estas histórias, existem outras que contribuíram para a sua lenda de homem bravo. Por exemplo, diz-se que tinha uma assolapada paixão pelo seu escudeiro, Afonso Madeira, e que, sabendo que este tinha um caso com uma tal Catarina Tosse, o rei mandou castrá-lo. Afonso foi tratado e sobreviveu, mas certamente nunca mais foi o mesmo.
Além disso, a lenda diz-nos que D. Pedro mandou desenterrar o cadáver de Inês de Castro e que a coroou rainha de Portugal, obrigando a corte a fazer beija-mão ao cadáver. Não existem provas documentais de que o seu amor tenha chegado a este ponto, mas esta ideia foi mesmo glosada por autores estrangeiros.
Do que não há dúvida é que o rei transladou com pompa os restos de Inês, do convento de Santa Clara, em Coimbra, para o seu belo túmulo no mosteiro de Alcobaça, ao lado do seu próprio túmulo.
São histórias incríveis e muito esclarecedoras destas personalidades do poder.