No século XVI, em plena era dos Descobrimentos, um jovem piloto decidiu arriscar tudo para provar o seu valor. Diogo Botelho, nascido na Índia Portuguesa e filho de um capitão de Cochim, era talentoso na arte da navegação e um apaixonado pelo mar.
Mas quando pediu ao rei D. João III a capitania de Chául, recebeu uma resposta humilhante: “Os pilotos não podem ser capitães de fortalezas!” O jovem ficou ferido no orgulho e jurou mostrar ao mundo do que era capaz.
Em vez de reconhecimento, Botelho viu-se preso e enviado de volta para a Índia, onde lhe foi proibido regressar a Portugal. Mas o piloto não aceitou o destino que lhe impuseram.
Decidiu regressar por conta própria e de forma espetacular: atravessaria o oceano numa pequena embarcação, provando a sua mestria na navegação e a sua lealdade ao reino.
Aproveitando o secretismo, Botelho construiu uma fusta, um barco pequeno e ágil, no qual planeava atravessar o Índico e o Atlântico. Com uma tripulação reduzida, incluindo escravos remadores, partiu clandestinamente da Índia em 1535, levando consigo uma valiosa informação: a fortaleza de Diu estava finalmente concluída.
A viagem foi um pesadelo. Tempestades, fome e sede testaram os limites da tripulação. Uma revolta dos escravos quase lhe custou a vida, mas Botelho e os seus homens conseguiram derrotá-los.
Exaustos e debilitados, chegaram aos Açores, onde foram recebidos com desconfiança. O corregedor das ilhas reconheceu Botelho como degredado e mandou vigiar os seus movimentos.
Fugindo às autoridades, Botelho conseguiu chegar a Lisboa antes que o capturassem. Sem perder tempo, montou a cavalo e cavalgou a toda a velocidade até Évora, onde D. João III estava hospedado. De madrugada, bateu à porta do palácio real.
Quando o rei e a rainha o receberam, ouviram-no relatar a sua extraordinária viagem. Diogo Botelho ajoelhou-se e declarou que arriscara tudo para mostrar a sua lealdade. Apresentou, então, os planos detalhados da fortaleza de Diu, que trouxera escondidos como um tesouro.
D. João III ficou impressionado e perdoou-lhe o degredo, permitindo-lhe regressar ao serviço na Índia. No entanto, o reconhecimento que merecia nunca chegou verdadeiramente. O pequeno barco que o trouxera de tão longe foi queimado por ordem do rei, talvez para evitar que outros tivessem ideias semelhantes.
A viagem de Diogo Botelho foi uma das mais ousadas da época dos Descobrimentos, mas continua a ser pouco conhecida. Num tempo em que as travessias oceânicas eram feitas em grandes naus, ousou desafiar o destino numa embarcação minúscula.
Hoje, a sua história merece ser recordada como um exemplo de coragem, persistência e amor pelo reino.
Se tivesse vivido noutra época, talvez o nome de Diogo Botelho estivesse ao lado dos grandes navegadores portugueses. Mas, tal como muitos heróis anónimos, a sua maior recompensa foi o orgulho de ter desafiado o impossível.