A Ermida da Senhora da Teixeira, em Sequeiros, concelho de Torre de Moncorvo, Trás-os-Montes, constitui um testemunho notável do século XVI. Situada num espaço rural, ladeada por oliveiras e outras culturas, ganhou fama pelos 40 painéis de frescos, inspirados em cenas do Novo Testamento.
Estas pinturas estão associadas à obra de Miguel Ângelo, célebre mestre do Renascimento italiano, e fazem com que muitos se refiram ao templo como a “Capela Sistina do Douro Superior”.
Segundo a tradição, foi um eremita, de nome desconhecido, que construiu este espaço de oração. Terá vivido em isolamento e recebido inspiração da Capela Sistina, em Roma, adotando a técnica de pintura a fresco: os pigmentos são aplicados na argamassa ainda húmida, o que permite cores intensas e duradouras.
Crê-se que o eremita percorreu a Itália para absorver o génio de Miguel Ângelo e, ao regressar, recriou cenas bíblicas, como a Natividade, a Adoração dos Magos, a Fuga para o Egito, a Última Ceia, a Crucificação, a Ressurreição, o Pentecostes e o Juízo Final.
A presença de elementos que remetem para o profeta Moisés ou para a figura de Cristo no Juízo Final reforçam as ligações iconográficas com as obras do pintor renascentista.
A construção data da segunda metade do século XVI. Dedicada a Nossa Senhora da Teixeira, uma invocação profundamente venerada na região, a ermida foi erigida pelo próprio eremita com o apoio de um burro, como referem velhos relatos.
O espaço ganhou fama não só pelas pinturas, mas também pelas histórias que se contavam à volta do seu fundador, que teria decidido expiar pecados e dedicar-se à oração.
Acabou por permanecer até ao fim dos seus dias na ermida, onde foi sepultado junto ao altar. A sepultura ainda se encontra visível, perpetuando a memória de quem abraçou aquela vida eremita.
Algumas lendas envolvem esta construção. Uma das mais conhecidas diz que o eremita se chamava Jordão do Espírito Santo, homem oriundo de Entre-Douro-e-Minho que terá tido grande poder e fortuna antes de se retirar para o campo.
Há quem assegure que se deslocou várias vezes a Roma, trazendo mesmo pedras alegadamente retiradas da Capela Sistina, acreditando-se que quem as beijasse ficaria curado de qualquer doença. Outra lenda refere aparições frequentes de Nossa Senhora da Teixeira, que lhe concederia inspiração para pintar as paredes e o teto com elevada mestria.
Ao entrar na ermida, destacam-se os frescos que revestem todo o interior, desde o teto à base dos muros. As cores vivas, recentemente restauradas, captam o olhar de quem visita. Os painéis ilustram narrativas cristãs bem conhecidas e transmitem uma expressão artística invulgar para uma construção inserida num contexto rural.
Para além dos frescos, a capela apresenta uma arquitetura simples, com uma só nave, capela-mor quadrangular e sacristia adossada. O altar-mor, do século XVIII, exibe talha dourada, onde se encontra a imagem de Nossa Senhora da Teixeira. Algumas figuras de santos, como São Sebastião ou São Pedro, reforçam a ambiência religiosa.
A fachada principal ostenta um portal de arco abatido, sobre o qual se pode ler a inscrição em latim “Hic locus est sanctus” (“Este lugar é santo”). No remate superior, visualiza-se uma cruz latina assente numa esfera armilar, recordando a expansão marítima e o universo português de então. Esta combinação de elementos reflete o sincretismo entre a espiritualidade eremítica e a simbologia do império.
A Ermida da Senhora da Teixeira conserva um encanto raro, evocando histórias que passaram de geração em geração. Quem aqui vai encontra não só arte e religiosidade, mas também fragmentos de vida que transcenderam séculos.
Mesmo envolta em lendas, esta capela é um pedaço significativo do património do Douro Superior, onde o renascimento cultural e a fé se misturam de forma singular. O restauro recente contribuiu para valorizar as pinturas, permitindo que as tonalidades originais venham ao de cima e mantenham viva a herança do eremita.
Visitar o local é, por isso, uma forma de enaltecer a devoção e a criatividade que, em tempos, floresceram no coração de um homem anónimo e se perpetuaram ao longo dos tempos.