Quem observa a formação do território português costuma associá-la ao Condado Portucalense e à figura de D. Afonso Henriques. No entanto, antes disso, existiu na Península Ibérica um mosaico de reinos muçulmanos, conhecidos por taifas, que floresceram após a fragmentação do Califado de Córdova.
Entre eles, destacou-se o Reino de Badajoz, cuja autoridade chegou a estender-se por cerca de metade do que hoje corresponde a Portugal. A sua capital era a cidade de Badajoz, fundada em 875 pelo rebelde Ibne Maruane, que a ergueu num local estratégico junto ao rio Guadiana.
Formado por volta de 1009 ou 1013, o Reino de Badajoz surgiu numa época de instabilidade política e de dissolução do poder central islâmico. O primeiro governante foi Sabur, antigo escravo eslavo do califa Aláqueme II, que aproveitou a crise do Califado de Córdova para proclamar a independência.
Quando Sabur morreu, em 1022, o seu vizir Abedalá ibne Alaftas assumiu o comando, fundando a dinastia Aftácida. Gradualmente, o reino consolidou-se e expandiu-se, integrando boa parte da antiga Lusitânia romana, incluindo Mérida e Lisboa, prolongando-se até às proximidades do Douro a norte e abrangendo extensas zonas do Alentejo.
Sob os Aftácidas, Badajoz viveu um período de crescimento, embora marcado por disputas e acordos com outras taifas e com os reinos cristãos. A expansão do território deu-se por via de conquistas militares e alianças, anexando taifas como Lisboa, Mértola e Santa Maria do Algarve.
Em contrapartida, sofreu também revéses, em particular devido à atuação de rivais e à interferência de dinastias do Norte de África. A invasão dos Almorávidas, em 1094, pôs fim à primeira fase de independência.
Mais tarde, os Almóadas reforçaram o declínio político de Badajoz, ao integrarem os seus domínios no império berbere que controlava grande parte do sul peninsular.
Não obstante a instabilidade, Badajoz destacou-se pela promoção das artes, das ciências e da literatura. Alguns governantes eram eles próprios eruditos e mecenas, estimulando a criação de bibliotecas, escolas e círculos de intelectuais.
Nomes como Ibne Maruane, Alaftas ibne Maomé e Iúçufe ibne Alaftas, entre outros, tornaram-se conhecidos em áreas como a poesia, a história e a astronomia.
Esta efervescência cultural, comum a muitas taifas andaluzes, sustentava-se na convivência de muçulmanos, cristãos moçárabes e judeus, que partilhavam o território mantendo tradições, religiões e línguas distintas.
A economia local assentava essencialmente na agricultura, na pecuária, na indústria artesanal e no comércio com o Norte de África e com outros reinos ibéricos. A posição privilegiada de Badajoz, junto ao Guadiana, facilitava não só a irrigação, mas também as trocas comerciais.
Esta prosperidade material beneficiava uma sociedade diversa, onde até os escravos, de origens variadas, podiam ter a hipótese de ascender. O dinamismo económico e social do reino ajudou a moldar a cultura da região muito para além do desaparecimento político de Badajoz.
Durante o século XII, a Península Ibérica continuou a assistir a lutas intensas entre reinos muçulmanos e cristãos. Em 1094, os Almorávidas conquistaram o Reino de Badajoz, integrando-o nos seus territórios.
Em 1144, assistiu-se a uma breve restauração da autonomia, mas a chegada dos Almóadas, em 1151, extinguiu definitivamente o poder local. A cidade manteve-se em mãos muçulmanas até 1169, ano em que foi tomada por Fernando II de Leão, sendo logo recuperada pelos Almóadas. Acabou por cair definitivamente em 1230, conquistada por Afonso IX de Leão.
Com a integração na Coroa de Castela e Leão, grande parte dos territórios do antigo reino foi sendo dividida entre Portugal, Leão e Castela. A fronteira luso-espanhola ficou delineada pelo Tratado de Alcanizes em 1297, deixando Badajoz do lado de Espanha e delimitando as regiões do Alentejo e do Algarve no território português.
Apesar de ter deixado de existir como entidade independente, o reino foi recordado nos costumes, na arquitetura e até na designação da província espanhola da Estremadura.
Assim, a memória de Badajoz permanece um testemunho vivo da época em que a Península Ibérica foi palco de múltiplas identidades e heranças culturais.