A influência do árabe na língua portuguesa estende-se profundamente na etimologia de muitas palavras e na fonética. Este legado é um reflexo da interação cultural e linguística que se desenvolveu ao longo dos séculos de domínio muçulmano na Península Ibérica.
A herança árabe em Portugal começou com a conquista muçulmana da península no século VIII. Este período, que se estendeu por mais de 500 anos, permitiu que a influência árabe se enraizasse profundamente na cultura e na língua que viria a evoluir para o português moderno.
A arabização da Península Ibérica não se limitou a uma imposição linguística ou religiosa. De fato, o árabe coexistiu com os dialetos moçárabes e o hebraico, enriquecendo a linguagem da região.
Adalberto Alves, no seu “Dicionário de Arabismos na Língua Portuguesa”, destaca que os arabismos no português não se confinam aos cerca de 1.000 substantivos comumente citados.
Segundo o autor, esse número ascende a 18.073 termos, abarcando não só substantivos, mas também adjetivos, verbos, pronomes, artigos e interjeições. Esta extensão aponta para uma influência muito mais profunda e abrangente do que muitos estudiosos reconhecem.
Comparativamente a outras línguas ibéricas, como o castelhano ou o catalão, a influência árabe é particularmente distinta em Portugal, graças à sua posição geográfica que o colocava no cruzamento de influências culturais entre a Europa e o mundo islâmico.
Um dos traços mais evidentes desta influência é a presença de numerosos termos que iniciam com o artigo definido “al”, frequentemente integrado ao substantivo que segue.
Por exemplo, “azeite” vem de “al-zeite”, com “zeite” sendo uma adaptação do árabe para “óleo”. Outros exemplos incluem “alcântara” (a ponte), “almofada” (a almofada) e “azulejo” (a pequena pedra).
A influência árabe também se manifesta em uma rica herança de topónimos que atravessam toda a geografia de Portugal. Cidades e regiões com nomes como Algarve (“o ocidente”), Alentejo (“além do Tejo”) e muitos outros locais cujos nomes começam por “al” são diretamente derivados dessa era.
Durante o período da Inquisição, a expansão dos termos árabes no calão português ilustra a persistência dessa influência cultural. Expressões como “oxalá” (se Deus quiser), “olá” (Deus te saúde) e “olarilolé” (não há divindade senão Deus) refletem como as marcas religiosas se mantiveram vivas no quotidiano.
Mesmo após o fim da era de arabização com a Reconquista e a subsequente expulsão das minorias muçulmanas, o legado árabe permaneceu, profundamente entranhado na língua e na cultura portuguesas. Este impacto não se limita ao léxico, estendendo-se a elementos culturais, científicos e gastronômicos que foram introduzidos pelos árabes.
O estudo dos arabismos na língua portuguesa é mais do que uma simples exploração linguística; é um mergulho numa era fascinante da história peninsular que moldou de maneira indelével a identidade cultural de Portugal.
Este legado é um lembrete poderoso da capacidade das línguas de absorver e refletir as complexidades das interações humanas ao longo dos séculos, servindo como pontes entre diferentes culturas e épocas.