Em abril de 2022, o Palácio Biester, em Sintra, abriu finalmente as suas portas ao público. Há muito que suscitava interesse, talvez pelos contornos exteriores que parecem ter sido desenhados para prender o olhar de quem passa.
Agora, além do edifício, é possível explorar um Parque Botânico com cerca de seis hectares, concebido pelo paisagista François Nogré, e descobrir a harmonia entre espécies vegetais, pequenos riachos, lagos e recantos bem pensados.
A entrada faz-se pelo Parque, onde se adquirem os bilhetes (também disponíveis online). Logo ao entrar, a sensação é a de que se foi convidado a espreitar um cenário de outro tempo, como entrar num livro antigo, mas sem a obrigação de se decorar nomes de árvores exóticas ou contar quantos degraus tem cada miradouro.
Quem quiser pode utilizar o mapa fornecido, onde se destacam pontos de maior interesse: se não apetecer seguir as indicações, é sempre possível ceder ao espírito de aventura e improvisar o próprio percurso, algo que poderá resultar numa espécie de “safari botânico” sem leões , mas com fetos e flores.
Ao longo do percurso encontra-se a Casa de Chá, mesmo junto às Estufas, locais que convidam a uma pausa. Mais adiante, o Lago dos Fetos Australianos e o Tanque das Faias equilibram a envolvente verdejante com o som da água a correr. O Passeio Bordallo Pinheiro pisca o olho à tradição artística, e a Gruta da Pena, com as suas rochas arredondadas, parece saída de um conto fantástico.
Dois miradouros merecem especial destaque: o Miradouro do Castelo, junto à zona de merendas, com vista para o Castelo dos Mouros, e o Miradouro das Descobertas, mais isolado, mas com uma panorâmica que cobre o parque e a vila de Sintra.
O ideal é levar calçado confortável: caso contrário, corre-se o risco de transformar a visita num treino de montanha improvisado – uma lembrança para quem se entusiasma, mas não quer chegar ao fim do dia a arrastar os pés.
Depois de explorado o Parque, entra-se no Palácio Biester propriamente dito, erguido entre 1880 e 1899. Este foi o refúgio da família Biester e nasceu do traço do arquiteto José Luiz Monteiro.
A decoração contou com a mestria do entalhador Leandro Braga e a colaboração dos artistas Luigi Manini e Paul Baudry. A mais recente recuperação respeitou a essência original, mantendo muito do que lá estava. É como encontrar um álbum de família antigo quase intacto.
O interior do Palácio divide-se em dois pisos. No Andar Nobre destacam-se espaços como a Sala da Música, que estabelece ligação à Sala de Estar e ao Salão de Festas, áreas que permitem imaginar os serões de outros tempos. A Sala de Leitura é um recanto acolhedor, pensado para momentos calmos, enquanto através da janela se desfrutava da paisagem verdejante lá fora.
No piso superior, o Átrio dos Aposentos conduz à Capela Neogótica, que reflete influências templárias e exibe belos vitrais, iluminando o espaço com várias tonalidades.
Neste mesmo nível encontra-se o Quarto Principal, onde repousava o casal Biester, com um closet então muito moderno. A decoração com anjos e elementos vegetais faz-nos pensar que os donos não resistiram a deixar a sua marca pessoal, quase como quem escolhe papel de parede invulgar para impressionar as visitas. Este quarto proporciona ainda uma vista formidável, perfeita para quem gosta de fingir que vive num postal ilustrado.
A visita interna revela ainda a existência de uma Câmara Iniciática, ligada à Capela e ao jardim, onde o ambiente de mistério é palpável. Esculpida na pedra, dá acesso a túneis que conduzem ao exterior, algo que desperta a imaginação e nos faz sentir num enredo de aventura histórica.
Existe ainda um elevador manual, instalado por Raúl Mesnier de Ponsard, uma raridade que mostra que o conforto não era esquecido, mesmo numa época em que os “luxos mecânicos” não eram para todos.
No final, o conjunto Parque-Palácio deixa a sensação de se ter descoberto algo especial. Não é apenas a beleza, nem apenas a história, mas a forma como tudo se encaixa.
É possível que se saia com vontade de voltar, ou pelo menos de recomendar a amigos, com um discreto sorriso, este recanto de Sintra onde o passado parece ainda espreitar por detrás de cada porta.