Mais do que um ícone mirandês, os Pauliteiros de Miranda são hoje um ícone nacional, embora possam, muitas vezes, ser mal interpretados ou até generalizados. Por exemplo, apesar do atual nome desta dança, a verdade é que Miranda do Douro não é a origem destes grupos. O atual nome decorre de uma generalização, por ser maioritariamente neste concelho que se concentra a maior atividade dos pauliteiros.
No entanto, há outros concelhos circundantes que têm ou tiveram destes grupos, como Bragança, Vinhais, Mogadouro, Vimioso ou até Macedo de Cavaleiros. E isto falando só no território nacional, porque os pauliteiros existem ou existiram em diversas regiões de Espanha, sendo por lá conhecidos como danzadores (e a coreografia conhecida como danza de palos). É certo que a maioria se concentra hoje na parte fronteiriça ao Planalto Mirandês, mas isso não inviabiliza a sua tradição noutros locais.
Existem várias teorias sobre a origem desta dança. Para alguns, trata-se da evolução de danças de armas gregas, por vezes chamadas de Danças Pírricas. Para os apoiantes desta teoria, os gregos passaram a tradição aos romanos, que a propagaram para a Península Ibérica.
Outra hipótese é que tenha uma origem indo-europeia, vinda até nós pela mão de povos como os celtas ou pré-celtas. Para outras pessoas, esta dança tem uma origem medieval, sendo mais recente do que à partida se possa pensar.
Seja qual for a teoria, é bem plausível que esta seja de facto uma dança de armas ou uma dança de guerra, onde os paus substituem o que outrora foram espadas. A partir daí, a dança pode-se ter desenvolvido para outros fins, como o galanteio ou de celebração de ciclos. O fato de os grupos de pauliteiros serem originalmente homens solteiros aponta exatamente para a hipótese de uma dança guerreira.
Com o tempo e com a absorção do Cristianismo, os costumes pauliteiros foram-se encaixando nesta nova liturgia, e é por isso que hoje fazem parte das celebrações de santos na região de Trás-os-Montes.
A música que acompanha o movimento destes dançadores tem um timbre guerreiro, muito graças à utilização da gaita mirandesa. A este instrumento costuma-se juntar uma caixa, um bombo e os paus. Por vezes, os próprios pauliteiros empunham também castanholas. Noutros tempos, dançava-se também ao som da flauta tamborileiro, outro ícone cultural mirandês, mas dificilmente iremos encontrar a sua presença estes dias.
As coreografias em si obrigam a que os grupos que vão ao baile sejam constituídos por 8 homens, alinhados em duas filas de 4. Os 2 pares das pontas são os guias e os 2 do meio são os peões. No entanto, ao longo da dança, vão trocando posições, numa geometria que nos faz dar voltas ao cérebro.
É claro que as coreografias variam, mas algumas são imprescindíveis, como o famoso assalto ao castelo, no qual um dos membros avança em direção a uma formação humana em forma de pirâmide, que representa um castelo. Com a ajuda de um impulso, pula e projeta-se para o outro lado.
A toda a dança está associado um traje. Assim, é tradicional vermos camisas de linho brancas, cobertas por jalecos de cor acastanhada, lenços de tons vistosos, chapéus negros decorados com flores, meias arrebitadas até cima e uma saia.
Não se sabe de onde vem o hábito de se usar saia para esta dança. Para algumas pessoas, esta é uma atualização recente ao traje original, que usava calças.
Para outros, este é um costume milenar, associado a uma marca identitária tribal, com paralelismos com outros trajes similares, como o traje tradicional escocês. O que é certo é que a saia se transformou numa espécie de símbolo dos pauliteiros, predominando largamente em relação aos trajes com calças.
Os pauliteiros de Miranda foram alvo de um processo de uniformização do folclore nacional, levada a cabo pela máquina de propaganda do Antigo Regime. É por isso que hoje podemos encontrar grupos de pauliteiros em regiões pouco prováveis.
Mas, se é um facto que, no passado século, a propagação da tradição desta dança a outros pontos do país se fez por motivos políticos, é também inegável que a facilidade e melhoria dos acessos e mesmo uma certa globalização cá dentro fez com que, nos dias de hoje, se possam criar grupos de pauliteiros onde quer que seja.
Mesmo assim, a vasta maioria dos grupos concentra-se nos concelhos do Planalto Mirandês, desta vez com um extra: a criação de grupos de pauliteiras, ou seja, grupos femininos com vestimentas e coreografias idênticas às dos seus comparsas masculinos.
Outra novidade, derivada da falta de população no Nordeste, é a existência de grupos que combinam rapazes e raparigas de aldeias diferentes, quando antes era obrigatório que cada localidade tivesse o seu próprio grupo, apenas com habitantes.
Se for, de facto, uma dança guerreira de origem greco-romana, a saia corresponde à que os legionários usavam.