Alguns portugueses conseguem destacar-se nas mais variadas áreas, sendo um símbolo das nossas qualidades nacionais. Existem exemplos em áreas como a arte, arquitetura, futebol e até no exército. Neste último caso, falamos em específico no soldado mais condecorado da história do exército, que ficou conhecido como Soldado Milhões.
Aníbal Augusto Milhais, o futuro Soldado Milhões, nasceu a 9 de julho de 1895 e sempre foi um homem valente. Graças à sua coragem, tornou-se o soldado português mais condecorado da 1ª Guerra Mundial, tendo sido inclusivamente condecorado no campo de batalha com a Ordem Militar da Torre e Espada, a mais alta honraria.
Tudo isto num homem que, à primeira vista, poderia parecer um ser humano simples. Tinha 1,55 m de altura e, a princípio, ninguém esperava que dali viesse um grande herói.
![Soldado Milhões](https://www.vortexmag.net/wp-content/uploads/2022/08/Anibal_Milhais.v2-639x1024.jpg)
Mas os homens não se medem aos palmos. Aníbal embarca para um país que não conhece aos 20 anos, para combater na guerra. Inicialmente, foi recrutado e incorporado no Regimento de Bragança, passando mais tarde para o Regimento de Chaves.
O homem aparentemente banal revelou-se um atirador de elite, conseguindo disparar a uma distância de 200 metros. Em 1917, partiu para a frente de combate. Um ano depois, acontece a famosa Batalha de La Lys.
Nessa batalha, ocorrida a 9 de abril de 1918, os alemães atacaram as forças portuguesas. Segundo dizem as crónicas, nesse dia, a situação não podia ser pior para o exército nacional.
As forças portuguesas estavam destroçadas, e os poucos sobreviventes sentiram-se obrigados a retirar, especialmente após a ordem de evacuar ter sido dada. Mas Aníbal não era um homem qualquer, e disponibilizou-se para lá ficar de forma voluntária, permitindo que os restantes soldados tivessem mais hipóteses de sobrevivência ao efetuarem a sua retirada.
![Soldado Milhões](https://www.vortexmag.net/wp-content/uploads/2022/08/6FJmzhg-min-769x1024.jpg)
Apesar de correr o risco de ser punido por desobedecer a ordens, Aníbal não abandonou a sua posição e ficou sozinho a defrontar o inimigo. A sua decisão foi importante, por permitir aos companheiros escapar e recuarem em segurança para linhas mais resguardadas, a cerca de 30 km. Graças à coragem do Soldado Milhões, a maioria dos soldados que fizeram a retirada acabou por sobreviver.
Usou a sua baixa altura de forma sagaz e, ao longo de dias, movimentou-se furtivamente, saltando de trincheira em trincheira, para recarregar a metralhadora com os cartuchos dos soldados mortos e dar a impressão de que a linha ainda se encontrava protegida por diversos soldados, quando, na verdade, apenas Aníbal e a sua metralhadora Luísa se encontravam a defender a linha. Quando o setor foi tomado de assalto pelos alemães, já Milhais se encontrava longe.
Para se esconder e deixar passar os alemães, ele chegou a aproveitar uma tela de tenda e a carcaça de um cavalo morto. Vagueou sozinho pelos campos, durante dias, com apenas algumas amêndoas doces para comer.
Chegou a metralhar alemães para salvar um grupo de escoceses de serem capturados e, mais tarde, salvou um major escocês de morrer afogado numa passagem a nado.
Este major deu conta dos feitos deste transmontano ao exército aliado, e o pequeno Aníbal tornou-se uma lenda. Aí nasceu a sua alcunha, quando foi efusivamente recebido pelo seu comandante, que lhe disse “Chamas-te Milhais, mas vales Milhões!”.
Aníbal Augusto Morais acabou por receber, diretamente no campo de batalha, o Colar de Torre e Espada, como homenagem pelos seus feitos. Recebeu esta honraria perante o desfile em continência de 15 mil soldados aliados.
Após o armistício, o Soldado Milhões, lenda viva do exército, regressa a Portugal a 2 de fevereiro de 1919. Em homenagem ao seu herói, o nome da sua terra, Valongo, passa a ser Valongo de Milhais.
Na sua terra, casa com Maria de Jesus e, juntos, têm 10 filhos, chegando apenas 8 a adultos. Vivem dias difíceis, a trabalhar no campo, e Milhais decide emigrar para o Brasil em 1928, para fazer face à crise.
Na sua aldeia, realizam um peditório para pagarem a Milhais a viagem de regresso a Portugal, dizendo que “um herói da pátria não deve estar emigrado; deve estar mas é no seu país, como símbolo, como reserva de um conjunto de valores”.
Assim, o Soldado Milhões volta a Portugal a 5 de agosto de 1928, voltando ao trabalho no campo para sustentar os filhos. O Estado Português decide atribuir-lhe uma pensão, como reconhecimento da nação. Mas esse apoio era de apenas 15 escudos mensais, algo que se manteve ao longo de 22 anos.
Milhais faleceu a 3 de junho de 1970, com 75 anos. As medalhas que conquistou no campo de batalha fizeram dele o soldado português mais condecorado da história, um feito que levou a que, na altura, lhe aumentassem a pensão para pouco mais de 100 escudos por mês.